A Repressora Voz ou O Dedo que Aponta

O Quarto estava escuro, nenhum vira lata latia, e o menino estava deitado e pronto para dormir.

— Psiu... — Ouviu o menino na escuridão.

— Quem está aí? — Perguntou ele.

— Sou eu, a voz do seu silêncio.

— Deve estar havendo algum engano silenciosa voz; estou te ouvindo muito bem.

— Você de fato houve a minha silenciosa voz, que fala, mas não consegue ouvir suas próprias emoções, que calam.

— É algum enigma silenciosa voz?

— Enigma nenhum menino. Somente existo e me expresso na dor calada e muda de suas emoções reprimidas; seu silêncio doloroso é o meu glorioso pão.

— Mas por que você age assim silenciosa voz?

— Cada qual segundo a sua própria natureza menino. Todos precisam viver, inclusive eu, seu silêncio repressor. Fui contratado pelo seu velho ego para fazer este servicinho. 

— Meu velho ego?

— Sim... ele mesmo.

— Quem é ele silencio repressor, quem é o meu velho ego?

— Difícil a resposta menino. Sinceramente não sei, e mesmo se soubesse não lhe diria, pois meu trabalho é calar e não falar. Mas como não sou tão perverso assim, e como a noite avança, experimente perguntar para a Coruja.

— Vá embora silenciosa voz.

— Não vou menino! Enquanto houver escuridão e a sua permissão permanecerei aqui.

— Minha permissão?

— Sim menino... somente estou aqui porque você permite. Veja bem, você pode não gostar de mim — sem problemas —, mas até eu menino, que ajo na escuridão, tenho lá os meus princípios e o meu código de ética. 

A hora avançava, e o menino estava cansado daquela silenciosa conversa e com sono. Começou então a tentar ouvir suas próprias emoções; estava farto daquela repressão e daquele pensar repetitivo e inútil.

— Psiu... — Ouviu o menino na escuridão mais uma vez.

Neste momento seu sangue ferveu nas veias; percebeu então — apesar da escuridão —, que a voz repressora de suas emoções apontava o dedo em riste para ele, enquanto pronunciava o intimidador, cínico e nefasto psiu. Aquilo era demais... aquilo era um abuso, uma invasão dos quintais de suas emoções e uma tremenda falta de respeito. 

Então, cheio raiva contida e dignidade pessoal, o menino mordeu com toda a força aquele dedo; mordeu assim como mordem os cães que brigam pelas ruas. Neste exato momento ouviu um urro de dor, o dedo foi recolhido e a escuridão do quarto se dissipou. O menino olho para os lados e não viu absolutamente ninguém.

Sorriu contente e começou a cochilar. Ouviu ainda ao longe o latido de um cão. Devia ser um nobre vira lata zelando com dignidade pelos domínios de seu dono; o menino amava os vira latas. 

Comentários

  1. Que delícia de conto! Ouvi o urro da mordida e vi o sorriso libertador no seu rosto, antes do sono tranquilo!
    Continue, suas histórias ajudam muitos meninos e meninas interiores de todas as idades. Parabéns!

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