A Varinha de Guaximba, ou A Autoridade da Costureira, ou ainda Sábia, Sabiá, Sabia
Guaximba |
Minha mãe era costureira, fazia maravilhas na máquina, costurava para os pobres, para os de classe média, e eventualmente até para clientes ricos. Seu trabalho era conhecido e reconhecido, as roupas eram muito bem feitas, verdadeiras obras de arte, tudo sob medida. Passou muitos anos de sua vida dentro do quarto de costura, muitas vezes mais de 12 horas por dia. Ora costurava, ora cortava, ora media, ora orava e assim por diante, não obstante, gerenciava também sua casa, educava e orientava os filhos, todos tinham seus deveres, suas obrigações... Minha mãe possuía apenas a instrução primária, estudou lá na roça, no interior do Espírito Santo, em uma escola rural, e a distância da sua casa até a escola era de aproximadamente uma légua sesmaria (Seis Quilômetros), que ela muitas vezes percorria à pé. Apesar do pouco nível de instrução escolar, minha mãe era muito sábia, gostava de ouvir o canto da sabiá, e sabia que a educação era muito importante na vida dos filhos, de forma que na minha casa além das obrigações cotidianas, era o dever de cada filho ir à escola. Eu era o caçula da turma, todos eramos muitos amados, mas eu na condição de mais novo ficava muito em contato com ela, eramos muito próximos, havia muito afinidade entre nós. E um belo dia, sei lá por qual razão, eu, do alto de minha autoridade de filho mais novo, disse para minha mãe que não iria à escola, que ficaria em casa brincando com os meus soldadinhos, fazendo qualquer coisa, porém naquele dia eu não iria assistir aula e ponto. Minha mãe carinhosamente insistiu que era importante, que eu deveria ir, e falou e falou, e eu simplesmente disse que não iria e pronto, estava pela primeira vez em minha vida desafiando a autoridade dela. Depois de muita insistência, eu era birrento e teimoso feito uma mula, ela percebeu que os argumentos não levariam a lugar nenhum, e passou a agir de forma prática. Chamou o meu irmão e pediu que ele fosse ao quintal e trouxesse de lá uma varinha de guaximba. E assim ocorreu, meu irmão sempre foi muito solícito e prestativo, não questionou a ordem, como um soldado disciplinado, foi, pegou a varinha, voltou e entregou para ela. E agora ela com a varinha na mão ainda perguntou mais uma vez: Filho você vai ou não vai para a escola? E eu respondi que não iria, minha decisão estava tomada. E ainda lembro-me muito bem das varadas que ganhei na perna, ela levantava a varinha e batia, batia devagarinho, sem raiva, sem ódio, com amor, mais batia. E eu sentia que as varadas doíam em mim, mas doíam nela também, e depois de algumas varadinhas nas pernas, eu finalmente mudei de opinião, com lágrimas nos olhos, com o orgulho ferido, eu peguei minha pastinha com os meus livros e cadernos e fui para a escola cumprir o meu dever. Depois daquele dia não mais ousei questionar a autoridade de minha mãe, a varinha de guaximba serviu para mim como uma valiosa lição para toda a minha vida, e hoje, tantos e tantos anos depois, quando eu ando pelos campos e por lá encontro a guaximba, lembro com profundo sentimento de gratidão daquele dia, daquela birra, daquele ensinamento, e sobretudo daquela costureira amorosa que sabia educar com amor, que sabia colocar sua autoridade, mesmo que para isto tivesse que fazer uso da varinha mágica, a varinha de guaximba, quão sábia e amorosa era minha mãe, e além de tudo isto amava o canto, o canto da sabiá.
Que saudades...
ResponderExcluirLinda e sábia lição! Alma de poeta, coração de passarinho, caráter de aroeira.
ResponderExcluirLembrei da minha mãe. Ela era costureira. Belo texto, obrigada amigo.
ResponderExcluirSó por hoje eu sou a pessoa mais importante da minha vida.