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Mostrando postagens de setembro, 2018

Balaio de Gatos

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Em uma das portas de meu universo mental, o feiticeiro encantado vai aos poucos descortinando seu reino mágico e maravilhoso, no qual sou convidado por ele a entrar, abandonando a realidade concreta do viver. Dentro do mundo do feiticeiro encantado, onde estou agora, tudo é exato como uma equação matemática, tudo é perfeito e programado, tudo é pontual como um relógio suíço, tudo funciona perfeitamente bem. Depois de tantos anos, estou cansado deste mundo perfeitinho e mental do feiticeiro encantado; o feiticeiro não admite nenhuma emoção ali, "quem afinal de contas precisa delas?", pensa o feiticeiro encantado. Consigo por alguns instantes ausentar-me do mundo do feiticeiro encantado, voltando novamente para a realidade concreta do viver; sinto agora vazio e angústia, dura é a realidade, e então novamente a porta se escancara, e de novo aparece o feiticeiro encantado sorrindo para mim, prometendo novos labirintos mentais para encher o meu tempo e minha vida, assegur

A Formiga e a Cigarra

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Era uma vez, numa belíssima manhã de primavera, uma cigarra cantando em paz e alegremente em um tronco de árvore. Passava por ali uma formiga cortadeira muito atarefada, que ouvindo aquele canto, deixou sua folha no chão e foi tomar satisfações com a cantora matinal. - Dona cigarra, muito bom dia. - Bom dia formiga... - Olhe aqui, a esta hora da manhã a senhora deveria estar trabalhando, ainda não aprendeu a lição? Por gentileza, quando vier o inverno, não vá, por favor, ao meu formigueiro pedir comida e abrigo. - Formiga... - tentou ponderar a cigarra. - Não tem conversa, a senhora é um péssimo exemplo para os jovens aqui da floresta, com esta sua cantoria inútil. - Formiga... - A senhora me ouviu Dona Cigarra? - Ouvi sim formiga, ouvi sim... Agora ouça amiga: Sou uma adulta agora e aprendi muito, internet sabe, está tudo lá, uma verdadeira enciclopédia... Vivi mais de dezessete anos no subsolo como uma ninfa, já vivi todos os meus invernos e outon

O Regresso de Marte

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Era uma vez uma casa que estava fechada há muitos anos; pelos cantos o mato grassava, tudo era sinal de abandono, as paredes cheias de limo, infiltrações por toda parte, tudo ali carecia de reparo; no quintal folhas não varridas, roseiras mortas pelos cantos, em todos os lugares somente desolação e ausência... Apareceu então um homem de meia idade que, freneticamente batia na porta; ninguém respondia, ninguém abria.  Sentou-se então nos degraus da entrada, e ficou pensativo e com o olhar distante e perdido, até que passou alguém na rua que o abordou... - Senhor, Senhor, precisa de alguma ajuda? - Gostaria muito de entrar na casa, porém a porta está fechada, e não tem ninguém lá dentro. - Senhor, moro nesta rua há muitos anos, e já faz muito tempo que não vejo mais ninguém na residência. - Meu amigo, você tem alguma notícia das pessoas que viveram aqui? - Bem meu Senhor, o dono, há muitos anos atrás foi o primeiro que desapareceu. Até onde eu sei, saiu para um

O Menino Alecrim e a Bruxa Vassorilda

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Tudo o que vai ser relatado agora aconteceu há muito tempo, bem no princípio, na época da fundação dos dois grandes Reinos da Escuridão , no tempo em que existiam meninos, bruxas, florestas e muitos encantos e desencantos... Era uma vez, no Reino Grandioso do Norte da Escuridão, o Reino do Norte, um menino chamado Alecrim, que desde muito pequeno gostava de andar livremente descalço pela floresta. O menino, fazendo jus ao nome, amava os pés de alecrim espalhados pelos campos, bem como todas as árvores que cresciam pelo chão, e possuía um verdadeiro encanto pelas andorinhas, que no verão voavam pelo céu.  Um dia, passando perto da casa da bruxa Vassorilda , Alecrim notou uma imbaúba cortada por ordens dela, o que comoveu o seu coração, e então, pegou algumas mudas remanescentes ali no chão e plantou bem longe, dentro da floresta. Voava por ali naquele dia um bem-te-vi que tudo viu e à todos anunciou: "bem-te-vi, o menino Alecrim plantou imbaúbas brancas dentro da floresta

O Édito das Cartas Banidas

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Era uma vez, no Grande Reino dos Confins do Sul da Escuridão , o Reino do Sul, um rei, senhor de todos aqueles domínios, de nome Zão, seu filho, o Príncipe Zinho e todos os seus súditos.  Na época desta narrativa o Reino do Sul passava por alguns problemas; de uma hora para outra, não se sabe bem o porquê, grande parte dos súditos passaram a jogar baralho de forma compulsiva, negligenciando suas tarefas diárias, gerando paulatinamente dificuldades para a economia em todos os amplos domínios do Rei Zão. Preocupado com aquela situação, o rei convocou seus conselheiros reais, a fim de deliberaram sobre aquela preocupante situação.  O conselho real foi então reunido, e ao longo de toda aquela tarde discutiram a questão. - As espigas de milho estão estragando no campo, - falou o primeiro conselheiro real. - O capim cresce a olhos vistos, e a próxima colheita já está comprometida, - ponderou o segundo conselheiro real. - Os pães estão sendo entregues com atrasos constantes

O Ceifador da Noite Escura

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Exausto, aquele homem havia lido em um velho livro, que a depressão era uma grande noite escura, como um imenso matagal, e que deveria então ser ceifada. Desde então, noite adentro, ia com sua poderosa e mágica foice, e sua grande vitalidade, ceifando as trevas, abrindo clareiras de luz. Depois de muito trabalho e de muita luz conquistada, o ceifador ficava contente com o seu esforço, - estava vencendo a grande inimiga, a depressão.  Cansado então, deitava e descansava, com a esperança de posteriormente voltar a combater as trevas, expandindo mais e mais seus domínios de luz com sua grande foice. Mas quando ele despertava do seu descanso, as trevas haviam novamente crescido e tomado novamente a clareira, assim como cresce o capim na primavera, e então o homem começava todo o trabalho novamente, desferindo grandes golpes na escuridão da noite, com sua potente foice, até a exaustão. 

A Formiga e a Coruja

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A noite ia alta; em um mourão de cerca uma coruja pousada olhava de forma muito serena para o céu,  e em baixo, no chão, as formigas cortadeiras movimentavam-se de forma frenética, carregando pedaços  de folhas para o formigueiro. No intervalo entre uma folha e outra, uma formiga um pouco mais atenta  observou a coruja solitária lá no mourão.  - Boa noite coruja, - falou a formiga. - Boa noite formiga. - Ando um pouco preocupada coruja... - Preocupada com o que formiga? - Bem... Descobri lendo alguns livros, que a terra gira em torno de si mesma a uma velocidade aproximada  de mil e setecentos quilômetros por hora, e que também viaja em torno do sol a uma estonteante velocidade de cento  e sete mil quilômetros por hora. Não é assustador coruja? - Creio que não amiga formiga. - Mas coruja, eu não sei quem guia esta nave chamada terra, não sei se ela pode colidir com algum astro celeste,  ou mesmo em sua viagem anual perder-se definitivamente pela imensidão

O Menino Lampião no Reino do Então

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Era uma vez um mês de inverno, no Reino do Meio, onde havia, entre outras coisas, um menino, sua cadelinha, uma floresta e muitas outras coisas mais. O menino Lampião e Luz , sua amiga de quatro patas, passaram o dia plantando árvores, e estavam bem longe de sua casa, no interior da floresta; quando o menino percebeu, a tarde caia e a noite já vinha próxima.  Largaram o trabalho e voltaram, a noite caiu logo, e então perderam-se pelo caminho. Lampião, muito atento e observador notou logo algo de anormal: Apesar de estar na floresta tão familiar a ele, as árvores agora pareciam diferentes e estranhas, como se ele estivesse em um lugar desconhecido. Andando desorientado pela floresta, Lampião encontrou um lenhador cortando árvores, preparando um grande e pesado feixe. - Bom dia lenhador, meu nome é Lampião, pode por favor me dizer que lugar é este, creio que me perdi por estas veredas.- Bom dia menino, você está no Reino do Então, governado há muito tempo pelo grande

Papel de Presente

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Meu Senhor e meu Deus... Sinto que todos os meus afetos, que todas as coisas, que tudo o que eu procuro, tudo, tudo... está tão distante, como se tudo estivesse embalado nestes bonitos papeis de presentes meu Senhor; eu então toco e não sinto, olho e não vejo, escuto e não ouço, e quando perto, estou distante, e quando distante, sinto nostalgia e saudade, e vou então meu Senhor, caminhando desesperadamente pelas veredas da vida, tentando, como um louco, desembalar a tudo e a todos, na vã esperança de estar presente, de estar contente,  de não estar tão ausente, por um segundo que seja... Meu filho, meu filho...  Não são os seus afetos que estão embalados em papeis de presentes, como nas vitrinas das lojas; é você meu filho que se auto embalou, que se auto alojou, distanciando-se dos demais,  sendo ainda incapaz de desembalar-se, doando para todos o verdadeiro presente de sua humana e divina presença. Meu filho, meu filho... Quebre a vitrina do seu egoísmo, rasgue o papel do

Próxima Estação...

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Lá vem o trem pelo seu escuro túnel, de uma distante e subterrânea maternidade... Embarque rápido meu amigo, neste trem que já abriu suas portas e está tão ávido por partir em frente, procure logo o seu lugar... Próxima estação Cinelândia, desembarque facultativo, soa a voz aguda no sistema de som; Leia rápido meu amigo, neste tempo que corre tão ansioso sobre os trilhos, termine logo este capítulo, dentro de um escuro túnel sob o chão... Próxima estação Catete, desembarque facultativo, anuncia a metálica voz; Converse rápido meu amigo, o trem está circulando e não para, termine logo este bate-papo, está quase chegando a sua parada... Próxima estação Largo do Machado, desembarque facultativo, anuncia a voz que sai da caixa de som; Abrace rápido meu amigo, o trem está correndo neste escuro túnel artificialmente iluminado, encerre logo com o afeto neste escuro buraco, que por tão obtuso, nega o acesso a qualquer raio de sol... Próxima estação Flamengo, desembarque faculta

Setembro Amarelo, Outubro Rosa, Novembro Azul

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Naquele mês de setembro que não era rosa, era amarelo, deparei-me dentro da mata com uma belíssima flor que, apesar de rosa, não era de uma roseira, era uma flor de hibisco, e a imagem da flor levou-me diretamente para o passado, rapidamente, como num trem bala japonês... Estava eu agora sob a sombra de uma majestosa mangueira, que não era rosa, era espada, e enquanto comia bolinhos fritos, ouvia as conversas de minha tia Rosa, que somente tempos depois, em um mês de outubro, quando minha mãe, no seu amado quintal cuidava de suas rosas, que apesar de amarelas, eram verdadeiramente rosas, eu vim a saber... que a minha tia Rosa não era Rosa, e tempos depois, em um mês de novembro, enquanto cuidava de suas azuis violetas, uma outra tia que não era a Alice, mas era uma maravilha, confirmou mesmo que a minha tia Rosa, não era mesmo Rosa, era Rosalina.  Agora eu sei e sinto titia, que a saudade é maior que a mangueira espada da vovó, mais doce e perfumada que todas as rosas cult

Quinto Passo

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No grande oceano havia um barquinho que navegava com grandes dificuldades naquela imensidão sem fim...  O barquinho estava de mau humor e de cara feia; o barquinho estava fazendo birra e navegava de má vontade; o barquinho estava com raiva, e com sua mente, proa, popa e coração completamente fechados; o barquinho estava angustiado e emborcado no mar; o barquinho estava prestes a fazer água e profundamente deprimido ... Um peixinho que nadava por ali, curioso com aquela situação puxou conversa com o pobre barquinho... - Bom dia barquinho, por que tanto descontentamento de sua parte? - Estou muito revoltado hoje peixinho - respondeu o barquinho na imensidão do oceano. - Mas por que barquinho, o que houve? - Você é muito simpático peixinho, vou então falar para você, para mim mesmo e para o imenso mar toda a verdade: Todo o meu despeito é porque eu, no meu imenso orgulho, gostaria mesmo de ser maior que o próprio oceano onde navego. Esta é a natureza exata de min

Um Museu em Cinzas

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Ah... Preciso queimar minhas lembranças, todas elas. Preciso transformá-las todas em cinzas, não quero contemplá-las e analisá-las, pois muitas delas trazem duras feridas dentro de mim. Minhas lembranças estão todas lá, dentro do meu vivo e pessoal museu, aguardando pela minha visita, reflexão e análise. Se eu tiver que lidar com elas vai advir dai muito sofrimento e mágoa, o metano putrefato de minhas recordações armazenadas e mal resolvidas vai eclodir, elevando a temperatura de minhas já descontroladas emoções.  Melhor não mexer com elas então, melhor deixá-las ao abandono, ou, melhor ainda, uma brilhante ideia: Melhor mesmo é queimá-las todas. Desta forma estarei definitivamente livre de meus fantasmas, medos, angústias, ressentimentos, erros, mágoas; desta forma estarei livre daquelas vozes abafadas em mim que clamam por vida, sol, luz, presença, carinho e observação.  Queimadas então todas as minhas incômodas lembranças, restarão delas apenas cinzas, e em mim, o incaut