A Coruja e o Neófito
Era uma vez, dentro de uma grande, verdejante e belíssima floresta, uma coruja que — quem diria — conseguiu alcançar a iluminação espiritual; deste então, passou a ser muito respeitada por todos os demais animais ali existentes. A coruja passou a ser um exemplo de leveza, luz, alegria e bem estar, quaisquer que fossem as circunstâncias exteriores.
A notícia se espalhou, chegando mesmo fora dos limites da floresta, onde vivia um homem que também buscava muito esta iluminação; conhecer aquela coruja passou a ser o objetivo primordial de sua vida.
Algum tempo depois este homem adentrou a floresta à procura da iluminada coruja; não procurou muito, todos os animais ali sabiam onde ela vivia, e ele, sem muita tardança chegou até ela.
— Boa tarde Coruja, desejo muito conhecê-la; viajei muitas léguas até chegar até aqui.
— Boa tarde homem — respondeu a coruja — Em que lhe posso ser útil?
— Gostaria muito de iluminar-me também. Poderia me ajudar?
— Pois não... é relativamente simples: Volte para a sua casa, abra a sua biblioteca, leia, estude e reflita longamente sobre o livro de sua vida.
— Desta forma eu consigo a iluminação?
— Sim, este método é infalível.
O homem agradeceu a coruja e voltou para a sua casa. Abriu a biblioteca — haviam centenas de livros por lá —, pensou um pouco, e então pegou um volume que sempre havia tocado o seu coração — O velho e o mar —, sem dúvida nenhuma, o livro de sua vida.
Leu o livro vagarosamente, degustando cada sentença, e conforme avançava naquela maravilhosa leitura, construía em sua mente os quadros daquela saga entre o homem e o grande peixe. Terminada a leitura, alguns dias depois, o homem não percebia em si nenhuma transformação, não havia alcançado o estado de plenitude que ele tanto buscava. Teria cometido um equívoco a sábia coruja?
Empreendeu novamente a viagem, precisava tirar aquela dúvida.
— Bom dia Coruja.
— Bom dia homem.
— Li o livro de minha vida, e sinto-me ainda sem a tão sonhada iluminação. Preciso novamente de sua orientação.
— Pois não... é relativamente simples: Volte novamente para a sua casa, abra a sua biblioteca, leia, estude e reflita longamente sobre o livro de sua vida; Observe bem homem: O livro de sua vida.
— Tem certeza que é somente isto coruja?
— Somente isto e nada mais, certeza absoluta.
O Homem voltou para a sua casa mais uma vez e abriu novamente a biblioteca. Possivelmente ele havia lido o livro errado, ele amava muitos daqueles livros. Desta vez leu O menino do dedo verde, e conforme avançava por cada página — tal o prazer que sentia —, guardava em si que a iluminação não tardaria, aquele realmente era o livro de sua vida.
Mas a história se repetiu e a iluminação não veio. Resolveu voltar mais uma vez para falar com a coruja, devia estar havendo algum engano.
— Coruja, li o livro de minha vida e nada de iluminação. É este mesmo o caminho?
— Sem dúvida homem. Volte lá e leia o livro correto que você alcançará o que tanto busca.
O homem voltou um pouco aborrecido; chegou então em sua casa, e como era muito determinado — obstinado mesmo —, e como amava muitos aqueles livros de sua biblioteca, resolveu então que leria e meditaria sobre todos eles, um por um, desta forma, a iluminação certamente viria.
Como eram muitos livros, ele demorou alguns anos para ler todos, mas, determinadamente, leu um por um. Ao terminar o último livro — estava exausto —, conhecia tudo sobre o que dizia cada um deles, mas em seu coração não havia nenhuma iluminação, nenhuma grande transformação, ele continuava mesmo sendo o mesmíssimo homem. Insistiu um pouco mais e leu as velhas revistas e jornais que lá estavam, e nada, leu as bulas de remédios ali existentes, e nada, leu enfim, até mesmo os rótulos de todos os produtos que ele encontrou por ali, e nada, absolutamente nada de iluminação.
Concluiu então que a coruja havia cometido um grande equívoco; estava cheio de amargura e ressentimento, havia perdido muito tempo preso ali naquela biblioteca. Resolveu voltar mais uma vez — a última vez — naquela floresta, e deixar patente para a coruja que aquele método de iluminação não havia funcionado com ele.
— Boa tarde coruja.
— Boa tarde homem.
— Li absolutamente tudo contido em minha biblioteca, e não consegui iluminação nenhuma. Creio que você deve ter cometido algum engano.
A coruja manteve o ar de serenidade. olhou mansamente para aquele homem, bem dentro dos seus olhos e respondeu amorosamente:
— O livro de sua vida é único e somente seu. Este livro não foi escrito por nenhum outro homem, mas por você mesmo, e somente você pode lê-lo e compreendê-lo, pois contém todos os registros sobre a sua própria condição humana, e está guardado dentro da biblioteca de suas emoções, no interior de sua casa, não a de quatro paredes, mas sua casa espiritual.
— Volte então para a sua casa, a espiritual — continuou a coruja —, e chegando lá, abra a biblioteca de suas emoções, e então leia, estude e reflita longamente sobre o livro de sua própria vida, o livro que revela toda a sua humana condição.
Ao ouvir aquilo o homem finalmente descobriu o seu grande equívoco, e percebeu finalmente o seu engano. Despediu-se com gratidão da coruja iluminada e partiu em seguida; tinha uma longa viagem pela frente, a viagem para o seu próprio mundo interior, a partir de sua própria casa, dentro da biblioteca de suas emoções, conhecendo o livro de sua própria vida.
Sua busca é visceral e você vai encontrar! Quem procura acha!
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