Os Carretéis da Costureira

Frutos da Mangueira
Enquanto a mãe costurava, o menino ficava ali por perto brincando agachado no chão entre os retalhos de tecidos com os seus soldadinhos de plástico.

Enquanto brincava ia observando a máquina de costura, mais precisamente o ponto onde o carretel ia sendo desenrolado, liberando fios para a confecção de alguma peça de roupa. Quando a linha chegava ao final, sua mãe fazia a recarga e dava para ele o velho carretel, que ele guardava em sua caixa de aviamentos de costura, também doada pela mãe. 

Depois de alguns dias o processo se repetia, ele ganhava da mãe um outro carretel, e agora, com dois já era possível criar alguma coisa. Os únicos brinquedos eram os soldadinhos que ele adquiria quando comprava balas na venda do seu Lobo, bem que ele gostaria de andar de bicicleta, ou velocípede, ou quem sabe, brincar com aqueles autoramas tão bonitos que ele via nas lojas, mas tudo isto eram apenas sonhos, a família era numerosa, o que seus pais ganhavam era apenas o suficiente para a manutenção de todos, de forma que não havia mesmo condição nenhuma para comprar brinquedos. 

Agora, com os dois carretéis, o menino ia ao quintal, arranjava um pedaço de ripa onde fazia dois sulcos de forma a encaixar os carretéis, e pronto, estava produzido o seu carrinho. Com o carrinho tão simples ele passava tardes e tardes brincando no quarto de costura de sua mãe, e era tão significativo para ele brincar com aquele carrinho de carretéis tão rústico, que  esquecia completamente que não possuía uma bicicleta, ou autorama, ou um forte apache, ou outro brinquedo qualquer, era como se o quarto de costura fosse encantado. 

Quase meio século depois, o menino, agora um homem, com os olhos cheios de lágrimas, descobre o segredo e consegue perceber que o encanto daqueles brinquedos por ele construído na infância, bem como o do quarto de costura, na verdade não estavam nos objetos e no ambiente, e sim no profundo amor de sua mãe, a costureira, que não podendo dar a ele brinquedos de verdade, dava então simples carretéis imantados do mais profundo amor, amor de costureira, amor de mãe.

Comentários

  1. Bela viagem no tempo. Assim valorizamos mais o presente, apesar da SAUDADE.

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  2. Bela viagem no tempo. Assim valorizamos mais o presente, apesar da SAUDADE.

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  3. "O essencial é invisível aos olhos!" Amor é a matéria prima da criação divina, e amor de mãe, é o mais próximo do Amor de Deus! Bendito seja o fruto daquela que amou tanto!

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