Tia Mariinha, a Lavadeira de Deus

Sua Benção Lavadeira de Deus
Morava no alto de um morro a minha tia, a lavadeira. De família pobre, com poucos recursos, ganhava a vida lavando roupas, ajudando ao meu tio que era pintor por profissão. Como o dinheiro era curto, conseguiram comprar lá no alto de um morro, nas terras do fazendeiro Damião um pedaço de chão , e lá fizeram a casa. Mais da metade do terreno era rochoso, naquela época não havia água encanada nas casas, cada morador cavava o seu próprio poço. Então seria para a lavadeira uma fatalidade, uma casa em um morro, e em cima de uma pedra, como conseguir água para lavar as roupas? Meu tio, com boa vontade, pegou as ferramentas e começou a cavar na pedra, e louvado seja, depois de furar menos de 1 metro, brotou água, muita água, por um capricho da natureza, naquele terreno, debaixo de uma rocha havia (e ainda há) água com muita abundância. E a tia, sempre bem humorada e feliz lavava muita roupa, tudo ficava muito branco, uma beleza, somente água, sabão, alvejantes e o sol, não havia máquina de lavar, a máquina era ela mesma. Lembro-me bem das grandes trouxas de roupas branquinhas, uma beleza. E depois de lavar e secar tudo, passava a ferro também, de forma que as roupas eram entregues à clientela rigorosamente limpas e passadas. Minha tia era boa de conversa, sorria sempre, que saudades daquele sorriso e daquela simplicidade, nos anos em que com ela convivi jamais a vi mal humorada, ela era realmente uma Graça. Mulata era minha tia, tal como meu pai, o caminhoneiro solitário, irmão da lavadeira, e como dizia o mestre Cartola, "ensaboa mulata, ensaboa, ensaboa, tô ensaboando". E assim viveu a minha tia, uma vida simples, ensaboando suas roupas e vivendo com dignidade. A vida a levou um dia, e hoje, depois de tanto tempo, sinto uma profunda saudade, um sentimento, quem sabe de respeito e gratidão pelo que ela foi enquanto esteve por aqui. Olhe lá aquele céu tão azul, tão alvejado, tão limpo, quem limpou? Foi a Mariinha. Olhe lá aquela nuvem tão bonita, tão branca, quem lavou? Foi a Mariinha. Olhe lá aquela estrela tão distante, tão brilhante, tão bela. Quem lustrou? Certamente foi a tia, a tia Mariinha, a lavadeira simples e pobre, a lavadeira de Deus.

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