O Engenheiro Celeste

Na vastidão das alturas brotou a saudade
 A vida não é fácil para ninguém, principalmente para os brasileiros. Quando ainda era jovem o garoto perdeu o pai, que morreu em um acidente de trabalho, e daí em diante a vida ficou ainda um pouco mais difícil, o pai faz sempre muita falta, é uma referência para toda a vida. Porém a vida continuou, e ele, mesmo sentindo aquele eterno e impreenchível vazio interior continuou o seu caminho, foi vivendo, estudando, sonhando, sofrendo, rindo, chorando, seguindo adiante... A educação poderia ser uma ponte para o futuro, e o garoto. apesar das dificuldades, estudou bastante e conseguiu completar o curso técnico. Ele, além da juventude e beleza, era também talentoso e inteligente, e logo, com a sua qualificação profissional conseguiu um trabalho lá em Vitória, capital dos Capixabas, e por lá ficou alguns anos, ganhando a sua vida e construindo a sua família. Seu pai havia sido também um técnico, e era também um aviador, com brevê e tudo, e o jovem herdou do pai o talento pelas alturas, porém não pilotava avião, gostava mesmo de voar de parapente (voo livre), e como voava aquele jovem. Depois de alguns anos na profissão de técnico, ele descobriu que queria mais, gostaria de estudar engenharia, ir um pouco mais além. Já era casado, tinha filhos para criar, tudo seria mais difícil agora, porém, ele não se deteve, mudou-se com toda a família para o Sul de Minas Gerais, foi fazer o seu sonhado curso em uma renomada faculdade, foi difícil, precisava estudar, dar aulas, fazer "bicos" a fim de levar o pão para casa, não foi fácil. A família cresceu, nasceu uma menina, clarinha, clarinha, e muitas vezes, o estudante e trabalhador chegava em casa à noite, cansado, porém o dia ainda não havia terminado, precisava ainda olhar os livros, e muitas vezes olhar também a menina clarinha, tão clarinha, não foi nada fácil, é claro, mas ele era brasileiro, não desistiu, continuou em frente, e depois de alguns anos, com muito esforço, realizou um de seus grandes sonhos, ele era agora um engenheiro. Não consigo imaginar a alegria dele recebendo o seu merecido e suado diploma, fruto do seu trabalho, esforço e obstinação. E a vida continuava para ele, haviam ainda outros sonhos, precisava morar em uma casa própria, e ele já possuía um terreno, no alto de um morro, em uma encosta. E pouco a pouco, nesta encosta, ele planejou e construiu uma linda casa, toda arquitetada, nos mínimos detalhes, casa simples, arejada, bonita, com muita luz solar, coisa de engenheiro inteligente e criativo. E a cidade onde ele vivia era propícia para voos livres, e ele, juntamente com os seus amigos, haviam inúmeros, voava e sonhava, haviam ainda outros sonhos a realizar. Ele já era agora um engenheiro conceituado, com uma família, possuía seus amigos, uma boa casa, porém o carro estava muito, muito velhinho, era um chevette, da época em que ele ainda era um técnico lá no Espírito Santo, e o carro já estava pela "bola sete", era preciso sonhar ainda mais e colocar um merecido e belo carro novo na nova garagem, da bonita casa no alto da colina. E assim ocorreu, ele conseguiu realizar mais este sonho, o carro estava lá, agora estava tudo lá, a casa, a família, a profissão, os amigos, o trabalho, ele era ainda tão jovem, e tinha toda uma vida pela frente. Tudo certo agora, tudo no seu lugar, porém como dizia o grande escritor russo Leon Tolstói, o que o homem põe, Deus dispõe, e um dia, sem muito aviso, de uma forma repentina, aquele talentoso e jovem engenheiro, com toda uma vida pela frente, depois de tanto sofrimento e esforço adoeceu, e em poucos dias já não estava mais com os amigos, com a família, com os colegas, o moço havia voado para muito longe e para sempre, foi chamado pelo Senhor da Vida, talvez, quem sabe, na época houvessem vagas em aberto no céu, vagas sobretudo para homens obstinados e talentosos, vagas para engenheiros, para engenheiros celestes. Onde quer que estejas meu querido Paulo, que herdou o nome de seu pai, também Paulo, também amigo das alturas, receba o meu abraço e eterno sentimento de gratidão, e guarde sempre a certeza que os seus voos de homem de bem jamais passarão, meu filho, seu sobrinho, também é Paulo, e infinitos Paulos ainda virão.

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