O Continente dos Homens
Era uma vez, há muito tempo atrás, em uma terra muito, muito distante, um homem que habitava uma caverna. Esta era funda, escura, desconfortável e úmida, mas como aquele homem era tão fechado em si mesmo, dormindo ali dentro um sono milenar — como um urso em estado de hibernação —, não havia jamais notado todos aqueles desagradáveis aspectos exteriores.
Mas assim como os ursos despertam, a fim de viverem plenamente a primavera e o verão, chegou finalmente também para ele o tempo do seu próprio despertar. Acordou então um dia, acendeu uma tocha e observou todo o espaço ao seu redor. Com a tocha na mão, caminhou em direção à saída da caverna, e do lado de fora percebeu que estava dentro de uma belíssima floresta; sentiu alegremente o frescor daquela manhã, ouviu os pássaros, o marulhar das águas no riacho próximo, sentiu a luz do sol, respirou ar puro...
O Homem percebeu que, além de estar dentro de uma floresta, sua caverna estava também no alto de uma pequena montanha, bem rente a uma grande encosta, e ainda, dentro de uma pequena ilha — uma ilhota —, de onde, do ponto onde estava, podia avistar outras diminutas ilhas próximas. Com um olhar mais atento, conseguiu mesmo verificar que cada ilha que avistava era habitada, tal como a sua, muito possivelmente por um único homem também. Um fato que o intrigou é que o mar que permeava todas aquelas ilhas era um mar de escuridão, e que, tal qual a sua própria ilha, todas as demais eram minúsculos pontos iluminados em meio ao grande mar escuro.
Naquela fase do seu despertar, por algum tempo, aquele homem iniciou o processo de conhecer a sua própria ilha; diariamente fazia longas caminhadas e ia observando todos os detalhes do mundo onde habitava. No final do dia voltava sempre para a sua caverna, que apesar de rústica, oferecia para ele segurança, uma necessária solidão e um grande conforto interno. Na entrada desta havia uma placa suspensa na parte superior, onde podia se ler em letras garrafais: "Caverna da Solidão, afaste-se."
Passado mais algum tempo, já conhecendo sua própria ilha, reformou toda a sua caverna — ele gostava de morar lá —, abriu grandes janelas laterais, permitindo a entrada da luz natural, nas sacadas plantou belíssimos gerânios, alargou a porta de entrada, providenciou água corrente... A caverna ficou bonita, um lugar enfim, agradável para se viver.
Bem instalado em sua casa interior — sua própria caverna —, e desejando em si a comunicação e a troca de conhecimento com os demais, construiu sobre a grande escuridão que permeava sua própria ilhota pontes para outras ilhas, onde passou a ir com muita frequência, abandonando finalmente o seu milenar insulamento para enfim, pouco a pouco, juntar-se ao universo de todos os demais homens.
Com as pontes sobre o escuro mar a partir de sua própria ilha, e as visitas constantes às ilhas vizinhas, a aproximação entre aqueles humanos insulados foi ficando cada vez mais frequente, e então, pouco a pouco, inúmeras outras pontes foram criadas entre as demais ilhas, até que, alguns anos depois, tal foi a aproximação e a amizade desenvolvida entre aqueles homens, que um fenômeno interessante aconteceu: As ilhas ficaram tão próximas umas da outras, e a escuridão que os isolava foi aos poucos desaparecendo, e desta aproximação tão fraterna e tão sincera nasceu finalmente um grande e único continente iluminado, o continente dos homens.
Contam que depois da fusão de todas aquelas ilhas, depois do nascimento do grande continente humano, a solidão e a angustia, dentre tantos outros sentimentos negativos — grandes males que assolavam aquelas ilhotas isoladas —, foram erradicados para sempre, tal como o imenso mar da escuridão.
Outra curiosidade digna de relato foi que, ao analisarem as ruínas daquelas cavernas nos sítios arqueológicos, os arqueólogos encontraram muitas placas petrificadas pela ação do tempo, dispersas por inúmeros locais onde, depois de demorados estudos, conseguiram finalmente decifrar o que estava escrito em letras garrafais: "Lar da solidariedade humana, seja muito bem-vindo."
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