O Céu do Agricultor
Era sábado à noite, e o agricultor foi dormir, afinal de contas, no dia seguinte precisava acordar cedo para ir para o mato cuidar de suas plantas. E ele deitou e logo foi envolvido pelo deus do sono, Morfeu, que o envolveu, e durante o sono ele sentiu uma dor muita profunda no peito, uma dor aguda, e em poucos segundos ele viu passar todos os quadros de sua vida, e então, mesmo não tendo percebido, ele havia partido desta para a melhor, afinal de contas, todos vão mesmo morrer um dia. E depois de um tempo indefinido, a dimensão era outra, o agricultor abriu os olhos e reparou que estava em um local muito bonito, com árvores para todos os lados. E ele andou um pouco e encontrou um portão onde havia alguém muito simpático que pediu para ele entrar, explicando que ele havia morrido e estava no céu, informando também que o céu era muito pessoal, cada um possuía o seu, e o dele, o agricultor, era um céu cheio de árvores, um local com milhões e milhões delas, e que de agora em diante, ele poderia ficar ali por toda a eternidade. O agricultor aceitou o fato, passou pela entrada e ficou maravilhado com tantas árvores e tanta beleza, e começou neste mesmo dia a vasculhar cada pedaço daquele novo mundo, do seu céu, e andava, subia nas árvores, comia muitos frutos, tomava banho em rios cristalinos, passava dias comendo jabuticaba, tudo uma beleza, um encanto. No céu tudo funcionava, ele não precisava fazer nada, era somente desfrutar de tudo o que havia lá, e assim por muito e muito tempo o agricultor foi conhecendo e deliciando-se com aquele local. Ele acordava cedo e fazia longas caminhadas, conhecendo novas árvores, novas paisagens, novas frutas, era muita beatitude para um homem só. E depois de algum tempo, talvez meses, ou anos, ou mesmo séculos, o agricultor já havia andado muito por lá, de forma que foi tão longe, que chegou aos limites do céu, onde havia uma cerca e um aviso para que os moradores das paragens celestiais não seguissem adiante, além da cerca haviam grandes áreas descampadas, sem sombra, com solo pobre, degradado, sem árvores, verdadeiros desertos de abandono, aquele local, diziam as placas era o inferno, e os moradores do céu, por todo o bem que haviam feito na vida que havia passado não precisavam ir para lá, deveriam viver por toda a eternidade curtindo as delícias celestiais. E daquele dia em diante algo aconteceu com o agricultor, ele foi ficando saudoso, todos os dias ia até aquela cerca e ficava olhando para o outro lado, para os campos abertos e abandonados, e então a nostalgia foi tomando conta dele, e ele apesar de estar fisicamente no céu, percebia que a cada dia o seu coração se distanciava de tudo aquilo e pendia mais e mais para o outro lado da cerca, para o inferno. E a situação ficou de tal forma aguda, que um dia ele foi à direção daquele paraíso e lá explicou para os dirigentes o que ele estava sentido, e relatou a eles o desejo de atravessar aquela cerca e ir cuidar daquele local. Os responsáveis perceberam que não havia mesmo jeito, a alma do agricultor, apesar do seu merecimento não estava mesmo ali, e então resolveram liberá-lo, deixar que ele fosse para lá, para o inferno, e disseram também para ele que as portas não mais estariam abertas, este era o regulamento, caso ele sentisse o desejo de voltar, para que as portas voltassem a ficar liberadas, ele teria novamente que recomeçar plantando um sem número de novas árvores. E assim ocorreu, ele concordou e então, de uma forma inexplicável, em um domingo, seis horas da manhã, o agricultor acordou, lembrou-se vagamente de um sonho onde havia uma cerca, e além desta um pasto sem árvores, precisando de carinho, de mudas e ele estava naquele momento preparando-se com toda a alegria para ir para lá, e neste sentimento feliz ele percebia, como em um sonho, que estava indo para o céu, o céu do agricultor.
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