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A Criança, o Velho Manuscrito e a Linguagem do Coração

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Aquele manuscrito exposto em um museu, havia sido encontrado em alguma caverna nas proximidades do mar morto, e por décadas, nenhum arqueólogo, bem como nenhum outro ser vivente, havia ainda conseguido traduzi-lo.  Numa certa tarde, num grande esforço mundial, todos os grandes sábios do mundo foram chamados para tentar desvendar o grande enigma do manuscrito; tudo em vão, ninguém conseguiu ler aquele documento desbotado e amarelado. Então, aconteceu algo inusitado; um velho arqueólogo havia levado para a conferência um de seus netos, que era uma criança. Quando todos estavam desanimados pelo fracasso generalizado na tentativa da tradução, a criança foi até o documento, olhou para ele, olhou para o seu avô e os demais, e disse: —   Vovô, eu consigo ler o que está escrito aqui. O Avô, que era sábio, ao ouvir aquilo não ficou constrangido, apenas sorriu, e sorrindo, disse ao neto: —   Em que língua está escrito criança? —   Está escrito na linguagem do coração vovô. — ...

A Criança, O Discípulo e o Mestre

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Tarde de um sábado de inverno em uma sala de estudos na escola da vida; o discípulo já estava presente, e a aula estava prestes a começar. Instantes depois serenamente chegou o mestre,  trocando um profundo e amável olhar com o seu aprendiz; o livro foi aberto, e silenciosamente as lições começaram. Algum tempo depois, acompanhado por uma criança,  passa alguém pelas proximidades da sala, que observa então no interior desta um homem debruçado sobre um livro, lendo atentamente cada palavra  —   devia ser algum aluno  —   e ele estava só. Este alguém, ainda com a criança ao seu lado, passa ainda mais uma vez poucos instantes depois, e observando novamente a sala, nota o mesmo homem transmitindo amorosamente conhecimentos para alguém  —  devia ser algum mestre  —    e ele estava só. Sua mente ficou então confusa, e na confusão ele indagou: —    Como pode ser isto meu Pai do céu? O mistério foi resolvido pela criança ao seu la...

Uma Crônica Sem Palavras

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Naquele primeiro domingo de inverno, o Moço das letras tentava escrever uma crônica, mas por mais esforço que fizesse, nenhuma ideia ocorria-lhe na mente; estariam as palavras fazendo greve? Em determinado momento, ele ouviu uma voz que vinha de dentro, a voz de sua Criança Interior, e a voz, sem palavras, disse para ele: "Procure pelo seu amigo, o Agricultor Urbano, que através dele você escreverá no dia de hoje uma crônica sem palavras". O Moço das Letras confiava sempre naquela Criança, mas daí a escrever uma crônica sem palavras soava estranho para ele; mais por saudades do velho amigo, do que propriamente pela intuição interior, ele resolveu efetivamente visitar o Agricultor Urbano. Então, como sempre fazia, seguiu simplesmente o rastro verde deixado pelo seu amigo ao longo do caminho, até finalmente chegar à casa dele, naquela colina verdejante onde, a cada metro e meio de distância podia tocar-se em uma árvore ou mais.  Num primeiro momento ele não encontrou seu amigo ...

O Menino, o Homem e a Amendoeira

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Era uma vez um menino, que no outono ficava olhando com encanto a sua vizinha varrendo as folhas da amendoeira que caíam no quintal, muitas e muitas folhas. O encanto era tão somente do menino, pois sua vizinha não gostava daquelas folhas, que todos os anos sujavam toda a frente de sua casa  —  aquilo era um grande desencanto para ela. O menino não sabia se gostava mais do outono, ou das folhas de outono, ou ainda da própria amendoeira, que era belíssima e muito alta. Então, ele desejou um dia poder também varrer folhas de uma árvore como aquela nas proximidades de sua casa.  Cinquenta anos depois, quem passasse por aquela rua no alto de um morro, nos meses de outono, muitas vezes observava um homem contente da vida, com sua vassoura de piaçava nas mãos, varrendo carinhosamente enormes quantidades de folhas da amendoeira do seu vizinho do lado. Cada uma daquelas folhas seriam levadas para a mata próxima, onde seriam utilizadas como fertilizante natural. Aquele homem entra...

O Agricultor Urbano e o Ramo de Primavera

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Era um dia de verão, e o Agricultor Urbano, como qualquer cidadão comum, andava tranquilamente pela ruas. O calor era tanto que era possível observar a olhos nus o vapor subindo do asfalto, onde a temperatura deveria estar beirando os 50 graus. O Agricultor não dava muita importância àquelas elevadas temperaturas, ele não tinha em suas mãos o menor poder para mudar aquilo, mas olhando pelo chão, observou algo que deteve os seus passos: Um pequeno galho de um arbusto lenhoso de médio a grande porte, sem tamanho definido, de muitos ramos, espinhento, e em função de sua exuberante beleza, cultivado no mundo inteiro pelas sua inflorescências coloridas. Com a sua vivência no campo ele sabia que estava diante de um ramo de Primavera (Bougainvillea spectabilis).  O Agricultor notou então pelos ferimentos, que o pobre do ramo já havia mesmo sido atropelado por algum automóvel, e percebendo a seiva que, como lágrimas rolavam pelo asfalto, constatou que a planta ainda estava viva. Como naqu...

A Aljava, a Flecha, o Arco, o Arqueiro e a Presa

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Ao longe, como expectador, observo um quadro distante de mim... O habilidoso arqueiro saca de sua aljava uma flecha, retesa ao máximo o seu arco, aponta para a presa distante e dispara; a flecha mortífera voa vertiginosamente pelo espaço em um movimento parabólico, e certeira e impiedosamente atinge a sua presa. Aquela imagem causa-me indignação; aproximo-me do quadro e observo o arqueiro; sinto por ele raiva e desprezo; caminho agora em direção a sua pobre presa contorcendo-se em dores no chão; sinto por ela uma profunda compaixão;  Afasto-me do quadro em total desequilíbrio emocional; maldita aljava; maldita flecha; maldito arco; maldito arqueiro; sinto a profunda dor da indefesa presa.  Sou impelido por uma voz interior e imperiosa que vem de dentro de mim:  — Volte e olhe novamente! Aproximo-me e observo atentamente cada detalhe daquele quadro; sou eu a aljava; sou eu a flecha; sou eu o arco; sou eu o arqueiro; sou eu a indefesa presa. ...

O Agricultor Urbano e o Sorriso do Olhar

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O fato aqui narrado ocorreu há muitos anos; foi na época da grande pandemia mundial do coronavírus, período em que todas as pessoas precisavam sair de suas casas de máscara, a fim de evitarem o contágio.  O Agricultor Urbano naquele dia precisou abandonar sua enxada e seu campo, suas perneiras e suas botas, e ir até a loja de produtos agropecuários comprar ração para os seus três vira latas.  Saiu ele então de sua casa, devidamente mascarado e sem suas perneiras e suas botas  —   evento muito raro  — , e enquanto andava pelas ruas, procurava sempre manter uma distância de mais ou menos um metro e meio das pessoas que o circundavam. Chegando à loja, aguardou pacientemente na fila do lado de fora desta; naquele dia ele não poderia entrar e conversar com os seus amigos que trabalhavam ali; naquele dia ele não poderia namorar as ferramentas; naquele dia ele não poderia admirar as botas nas prateleiras; naquele dia ele não poderia tocar nos grãos; naquele...