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O Amor nos Tempos dos Botões

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Era uma vez um tempo em que havia cerração nas manhãs — amada cerração. Era comum nestes dias, bem cedo, com a cerração presente, eu e minha mãe irmos até ao portão para nos despedirmos de meu pai — papai era viajante e saía sempre com a cerração presente, antes mesmo do canto dos primeiros pássaros. Papai, meia hora antes da despedida, ligava o motor e acendia a luz da cabine; naqueles instantes derradeiros antes da partida, eu — já de coração partido  —  entrava naquele local sagrado para ele, sentava no banco e ficava olhando encantado o volante, os vidros, o teto, os pedais, e sobretudo, o painel com uma infinidade botões, maravilhosos botões — um derradeiro olhar mágico dentro da cabine envolvida pela cerração da manhã.  Papai então dizia-me: "Para poder ir e voltar meu filho, é necessário conhecer a função de cada botão, e acioná-los no momento apropriado" — a carreta era a vida do meu pai. Encantado com tudo aquilo, e orgulhoso pela sabedoria do meu pai,...

A Insana Procissão

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A doença da emoção é como uma grande procissão, onde trafegam diariamente desde tempos imemoriais, somente os genuinamente loucos, andando sempre em círculos, do nada para lugar nenhum. Passa então um homem, que observa atentamente  a grande marcha daqueles alienados mentais; fica estupefato com tudo aquilo, e então, sentido-se muito feliz por não ser um deles, exclama: Que loucura! Como não tinha nada para fazer, não pretendendo mesmo ir a lugar algum, e completamente ciente de sua sanidade, resolve então ingressar na procissão, a fim de mostrar para todos, que ele, seguramente, jamais caminharia do nada  para lugar nenhum  —  Mais um na insana procissão .

Dongo Vivencia a Ira do Grande Gato Almirante

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Era uma vez um camundongo chamado  Dongo , o mais incomum dos camundongos ; num certo dia, enquanto caminhava pelo grande navio  — para Dongo o mundo era um grande navio  —, Dongo avistou em um canto o velho monte de sucatas  — aquilo já estava ali há muito tempo  — , e Dongo achava que não era problema dele.  Naquele momento o grande Gato Almirante  —  um gato angorá senhor de toda a vida e todo o navio  —,    que estava pelas proximidades, dirigiu-se a Dongo de forma direta e imperativa,  delegando a ele uma tarefa: "Dongo, hoje alguém virá aqui pesar e levar todo este ferro-velho, e o valor combinado foi de X Cruzeiros por quilo; preste contas para mim no final do dia!"   —  os gatos angorás não falavam, eles ditavam! O camundongo Dongo tinha pelo grande Gato Almirante um sentimento de profundo respeito e veneração  — Dongo amava aquele grande Gato ; seu coração disparou, ele precisava realizar aquela...

Dongo e o Grande Gato Amirante

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Era uma vez um camundongo chamado Dongo , o mais incomum dos camundongos; Dongo sofria de codependência, e neste estado de alma, via-se como um camundongo  —   Dongo era um homem  — , bem como todos os seus semelhantes como gatos.  Dongo convivia com os gatos, porém, como é natural, tinha medo deles  —  os camundongos temem os gatos. No universo de Dongo, o mundo era um grande navio que singrava diariamente os mares da vida — escuros e tenebrosos mares. Havia um grande problema na vida de Dongo com relação aos gatos: Os gatos angorás  —  Dongo não suportava os angorás. Na relação de Dongo com estes gatos o seu medo era patente; neste convívio, Dongo era efetivamente a presa  —  um camundongo  —    e os angorás eram, de fato,  os cruéis predadores  —  os gatos . Havia no navio onde Dongo vivia um almirante, responsável e senhor absoluto de toda aquela embarcação e pela vida de t...

A Jabuticabeira do Agricultor Sebastião

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Naquele domingo de primavera pela manhã, o Agricultor Urbano andava pela mata, juntamente com os seus inseparáveis vira latas, providenciando terra para encher os saquinhos para as próximas árvores.  Instantes depois, estava ele frente a frente com uma visão celestial: Uma jabuticabeira toda carregada de frutos amadurecidos, um mar de bolotas pretas afixadas no tronco e galhos. A árvore  não havia sido plantada por ele, o responsável pela área onde crescia a planta  — um espaço público no meio do nada  —  já havia morrido. O céu era de um azul intenso, e o dia estava claro e cheio de luz solar.  O Agricultor Urbano ficou ali um bom tempo degustando aquelas frutas deliciosas, e então reparou que o mato estava tomando conta de tudo; viu inúmeros pés de café sufocados pelo capim inculto; bananeiras crescendo com dificuldade, árvores necessitando de poda, touceiras de canas queimadas ... Veio então à sua memória a imagem do homem que cuidava de tu...

Dongo e o Gato Simpático

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Era uma vez um camundongo chamado  Dongo , que em um dia de verão estava em uma longa fila, uma fila quase sem fim, aguardando a sua vez de comprar a carne. Naquela época havia uma crise, e de vez em quando alguns produtos sumiam dos mercados .  Dongo já estava naquela fila há horas, havia chegado bem cedo, mas muitos outros haviam chegado mais cedo ainda. Depois de mais ou menos umas três horas o camundongo Dongo, apesar do cansaço, foi sentindo uma certa alegria, pois, com o andar da fila, já conseguia observar lá na frente o objeto de sua missão, a tão desejada carne. Suas pernas doíam; ele já não aguentava mais ficar na fila, "Deus é grande", pensou Dongo, e finalmente lá pelas onze horas da manhã havia chegado a sua vez. Olhou uma última vez para trás e aquela fila perdia-se naquele imenso corredor, era impossível descobrir quem era o último, "coitado do último"  —  pensou Dongo.  Então, do nada, como se estivesse vindo do espaço sideral, apareceu...

O Décimo Passo é uma Tijolada no Velho Ego

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"Continuamos fazendo o inventário pessoal, e quando estávamos errados, nós o admitíamos prontamente"; é este o enunciado do Passo 10 — o Passo da consciência.  Mas eu estava certo — o ego está sempre certo —, e além de estar certo, estava com raiva, com muita raiva — raiva velha, apodrecida e congelada. Estava enfurecido com a vida, sentindo-me uma grande vítima de circunstâncias cósmicas desconhecidas — assim falam alguns —, e além de tudo isto, sem nenhum poder para controlar aquela situação — o meu ego adora controlar tudo. Já eram muitas 24 horas na sala, eram muitas 24 horas de paz e serenidade, eram muitas 24 horas de recuperação, quase uma era, enfim — o ego gosta de falar e escrever sobre coisas bonitas —, contudo, alguns demônios — humanos demônios —, continuavam desestabilizando toda a minha estrutura de recuperação, minha casa emocional — seria uma casa construída na areia?  Então eu comecei a Pedir ao Poder Superior ajuda, e comecei a fazer para ele...