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Venha Criança, Venha...

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- Está escuro aqui... - Venha Criança, venha... venha que vou te embalar em meu colo até você adormecer, e juntos então atravessaremos a longa escuridão da noite da vida; - Estou com tanto medo... - Venha Criança, venha... venha que vou cantar lindas cantigas para você até o dia amanhecer, cantarei mesmo até o fim dos tempos de todos os teus temores; - Estou com tanto medo de sair, tanto medo de cair... - Venha Criança, venha... venha e segure em minhas mãos, vou amparar você, vou caminhar com você por todos os dias de sua vida, e se você cair, cairemos juntos, e juntos levantaremos, e juntos prosseguiremos; - Estou com tanto medo de olhar... - Venha Criança, venha... venha e olhe, venha e veja... veja o mundo, veja as pessoas e as coisas, veja o céu, veja o sol, veja tudo Criança, olhe para tudo sem medo, pois é pelo olhar que entra toda a luz da vida; - Estou com tanto medo de sentir... - Venha Criança, venha.....

Paralelo Mundo

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Não é hoje, não é aqui, não é agora; não foi ontem, foi muito antes, foi passado e sou uma criança; n ão sei onde estou, mas estou com medo... Medo de sair lá fora, tudo é hostil lá;  lá fora podem me contrariar, lá fora podem dizer não para mim, lá fora podem perceber a minha real natureza; lá fora posso ser visto, lá fora tem o bicho papão, lá fora tem o homem da capa preta que aponta o dedo; lá fora tem o homem do olhar de pedra, lá fora tem o homem do semblante fechado... Lá fora é terrível, não consigo ir lá fora, tenho medo... vou ficar por aqui, ficar em meu mundo... mas não existe nenhum mundo aqui dentro, somente o mundo lá de fora... vou criar então um mundo paralelo dentro de mim; um mundo protegido, um mundo só meu, um mundo onde ninguém entra, um mundo onde não sou olhado, visto, questionado, julgado; um mundo feliz e solitário, um mundo protegido de tudo e de todos, um mundo onde posso esconder-me da realidade lá de fora, a realidade que eu sou, a realida...

O Menino e o Circo

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O Moço das Letras estava na cozinha, na cidade do Rio de Janeiro, terminando de preparar o jantar daquele dia, — uma sopa de lentilhas. — Como tem passado Moço das Letras? — Falou a Criança Interior ali do lado da pia, ainda com aquela camisa vermelha e branca .  — Vou bem Criança, vou bem... — Belíssimas panelas as suas. Todas em aço inox e brilhantes, bem mais brilhantes do que as panelas do circo. — Circo? Que circo Criança? Além do guaraná lá na Praça do Estácio naquele domingo, você bebeu também outra coisa? —  Hoje escreveremos sobre um certo Menino... —  Qual deles? o menino Lampião do Reino do Meio, ou o menino Alecrim do Reino do Norte; ou ainda, o príncipe Zinho do Reino do Sul. —  Nenhum deles; escreveremos sobre o Menino do Reino do Concreto. —  Reino do Concreto? Que Reino é esse que eu não conheço. —  Conhece sim Moço das Letras. É o reino onde você vive. —  Ah... entendi. E é Concreto porque...

Se Alguém quer Matar-me de Amor, que Me Mate no Estácio

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Já passavam das vinte e uma horas quando o Moço das Letras embarcou em seu ônibus urbano em direção ao bairro de Botafogo, na cidade do Rio de Janeiro. Depois de alguns instantes estava no Estácio, perto do Sambódromo, onde avistou bem próximo uma praça tomada de crianças, jovens, adultos e idosos, todos ali, vivendo aquele instante descontraidamente, de um jeito único, um jeito bem carioca. O Moço das Letras observou a praça atentamente, e neste momento percebeu do seu lado no banco sua Criança Interior em pé, observando a praça também. - O que está fazendo em pé aí Criança? - Sempre gostei de andar em pé ao lado da janela, pois assim posso contemplar melhor a paisagem; faço isto desde os tempos em que ia com a costureira na feira.  O ônibus seguia o seu trajeto em direção ao Catumbi, o próximo bairro das cercanias. - Nenhuma árvore... - falou a Criança Interior. - É verdade Criança - respondeu o Moço das Letras. - A arborização das praças e ruas da cidade ...

Uma Verdadeira Fábula

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O Moço das Letras estava no Rio de Janeiro, almoçando no centro da cidade; o dia estava quente, muito quente. Então ele sentiu um beliscão em sua perna, "algum inseto talvez", pensou ele. Não era inseto, era sua Criança Interior que resolveu aparecer por ali. — Alo Moço das Letras. — Tudo bem Criança ? — Está faltando água!  — Sempre houve problema de falta d'água na cidade do Rio de Janeiro, principalmente na zona oeste, desde a época do império.  — Não... está faltando água no Reino do Sul. Você consegue uma sobremesa para mim.  — Claro Criança...  Poucos minutos depois a Criança estava comendo doce de abóbora, enquanto o Moço das Letras almoçava.  — Posso ditar uma história para você? — Perguntou a Criança.  — Complicado agora, não tenho como escrever aqui no restaurante.  — Fazemos assim: Eu vou comendo o doce e narrando a história, e à noite, na sua casa, você escreve, compreendeu? — Respondeu a Cri...

Conversa de Botequim

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- Garçom, por favor, mais uma cerveja.  Escuta mano... Sou hum mano, não sou dois ou três ou mais, sou somente hum mano; não sou hum mil reais mano, sou simplesmente hum mano. Sendo eu somente hum mano, ocupo-me somente daquilo que é de minha própria conta, pois sendo hum mano, não posso me ocupar da conta de dois ou três ou mais mano, pois sou apenas hum mano, e sendo assim, cuido e zelo somente por aquilo que me compete. Como sou hum, percebo que existem outros que são também hum mano, e assim como gosto e zelo pela minha unidade e liberdade, por ser hum mano, respeito a unidade e liberdade dos outros, que são também hum mano. Está entendendo a conversa mano? Papo reto mano, papo reto... não estou rasgando seda. Na multidão de vários sou apenas hum mano; se fosse eu mano, um fio de macarrão em uma macarronada, seria mesmo apenas hum mano, um único fio de macarrão no meio de todos os demais fios, está entendendo este papo mano? Papo reto mano, papo reto... ...

O Menino Lampião e o Professor Silvestre

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Era verão e o dia estava quente, muito quente; o Moço das Letras dirigiu-se à cozinha, precisava beber água. A porta da geladeira estava aberta, e bem em frente dela sua Criança Interior comia alguma coisa. O Moço das Letras não levou nenhum susto, já conhecia aquela Criança . - Tudo bem com você Criança?  - Sim... estou comendo beijinho de coco, um doce...  - Sim, é um doce muito gostoso, impossível mesmo comer somente um pedaço.  - Um doce a Gata de Olhos Verdes , aquela que fez o doce. Gostou da história da Vaca Malhada e a Anta Letrada ?  - Confesso Criança, que senti muita compaixão pela bicharada no final, principalmente pela pobre Vaca.  - Precisava ser escrito Moço, precisava ser escrito... Trago para você hoje uma história sobre um certo Silvestre. - A do Rato Silvestre você já me contou.  - Não é a do Rato Silvestre, é a do professor Silvestre. Podemos começar?  - Sim - respondeu o Moço das Letras....