O Agricultor e o Bambu Gigante

O que vai ser narrado aqui ocorreu em um tempo muito distante, um tempo em que um vírus denominado corona paralisou o mundo todo, levando grande parte da população mundial a cumprir um período de quarentena em suas próprias casas — aqueles que duvidarem consultem os livros de história.  Naqueles dias, o Agricultor Urbano trocou a prisão domiciliar pela liberdade de andar quase que o dia todo, com mais tempo e mais vagar, pela grande área verde nos fundos do seu quintal  suas botas ficaram muito gastas. 

Nas suas andanças, era comum para ele admirar com encanto, a grande moita de bambu gigante que crescia nos fundos da casa do seu vizinho. Os bambus eram enormes, e o bambual proporcionava nos dias de verão uma sombra agradável e cheia de frescor. Num certo dia o seu vizinho, que também gostava dos bambus, vendeu o seu terreno e  partiu para outras terras. Um jovem que não gostava de bambus adquiriu a propriedade e mandou buscar muitos tijolos e, por ordens dele,  um muro precisou ser construído, e para azar dos bambus, o horroroso interruptor de horizontes ocupou o exato lugar do antigo bambual, que formava uma cerca viva e natural — independentemente da idade, nem todos admiram e respeitam os bambus

Os construtores do muro, munidos de facões, serras, enxadões e picaretas, colocaram os bambus abaixo e, em seguida, em um local mais afastado, formaram uma grande pilha com aquelas varas enormes — com o tempo elas secariam e morreriam.

Grande foi o pesar do Agricultor; ele sentia um prazer enorme na contemplação e convivência com os bambus — coisas de homem do campo —, era como se fosse uma relação de amizade, e agora seus olhos deparavam-se com um muro cinza, feio e sem vida,  e os seus verdes amigos ali próximos, empilhados e morrendo aos pouquinhos sob o sol de verão.

O tempo passou e chegou o outono; com espírito prático, o Agricultor resolveu fazer uso daquelas varas secas; não fazia mais nenhum sentido ficar lamentando aquilo  o que não tem remédio, remediado está. Parte dos bambus ele utilizou para construir vários canteiros dentro da mata, e a outra parte ele simplesmente espalhou pelo chão do bosque, a fim de deter a erosão pela água da chuva e fertilizar o solo. Como eram muitos bambus, aquela tarefa consumiu várias horas do seu dia, mas ele fazia tudo aquilo com espírito de aceitação. O Agricultor sabia  da grande resistência e facilidade de germinação dos bambus, mas em sua mente, todas as aquelas varas estavam secas e mortas, infelizmente — não raras vezes a mente mente.

Felizmente ele estava errado; terminando o seu trabalho, no fundo da pilha seus olhos descobriram maravilhados um gomo do bambu verde e com brotos, um verdadeiro milagre da natureza  seu gigante amigo, apesar de todos os maus tratos, manteve em si acesa a chama da vida.

Grande foi a alegria do Agricultor ao descobrir que seu amigo havia resistido; então, aquele único gomo verde no fundo da pilha  um fio de esperança e resiliência  foi amorosamente conduzido por ele até o alto de uma colina próxima, onde foi plantado e regado. 

Agricultor não poderia assegurar se aquele diminuto broto voltaria novamente a formar um enorme bambual com suas varas imensas, que de tão altas, quase alcançariam o céu  o resultado daquela ação estava nas mãos de Deus. Mas uma certeza ele guardava em seu coração: Tanto ele, quanto o seu gigante amigo, fariam todo o possível para a realização daquele sonho comum, um simples sonho de novos encontros debaixo da  sombra acolhedora, onde ele poderia admirar o horizonte sem fim, ouvindo um hino de amor e gratidão de seu vegetal companheiro, quando tocado pelos maravilhosos ventos de outono, nas belas tardes plúmbeas da vida. 

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