O Agricultor e a Lâmpada Maravilhosa
Nina e Tição zelando pelo agricultor |
O agricultor estava no campo cuidando de suas árvores, o dia estava quente naquela manhã de domingo, e haviam ainda muitas mudas para serem plantadas. E ele ia fazendo as covas e colocando em cada uma delas uma muda, e o tempo passando, e ele cavando e plantando. Já eram quase 10:00 horas da manhã, faltava uma última muda, ele pegou sua poderosa cavadeira de metal maciço (o Valentim), e começou a cavar o último buraco daquele dia. De repente, ao cavar, ele ouviu um barulho, um toque de metal com metal, o que seria? Pensou que talvez pudesse ser um pedaço de ferro velho ali jogado, ou uma lata velha, ou outra coisa qualquer. Retirou a terra do fundo do buraco cuidadosamente, e lá no fundo encontrou algo muito antigo, semelhante às lamparinas de azeite que haviam na casa de seus avós, e que ele não via a muitos e muitos anos. Retirou a lamparina do buraco, e percebeu que, apesar de velha, estava ainda em bom estado de conservação, um pouco enferrujada e suja de terra. A lamparina possuía uma cor bonita, e o agricultor, para observá-la melhor, resolveu limpá-la, esfregando-a em suas mãos, e eis que neste processo algo de extraordinário aconteceu, acredite quem quiser: De dentro da lamparina, envolto em uma nuvem de fumaça, surgiu um gênio, tal como no Conto de Aladim e a Lâmpada Maravilhosa, e o agricultor não sabia o que fazer, não sabia se deveria correr, ou fugir, ou falar com o gênio, ficou completamente atônito. O gênio olhou para ele calmamente, de uma forma muito natural, e então eles começaram a conversar.
- Saudações meu Amo, vida longa, que Deus o abençoe, - falou o gênio. O agricultor, refeito do enorme susto, achava mesmo difícil acreditar naquele fato, porém não havia mesmo como negar, era dia, um dia claro e bonito, céu azul, tudo era real, portanto aquela aparição não era evidentemente fruto de sua imaginação. - Quem é você, e em que posso lhe ser útil? - perguntou o agricultor. E então o gênio explicou para ele que estava ali para atendê-lo em três pedidos, que era esta a sua função, e que o seu último Amo havia sido mesmo o Aladim, lá das fábulas, que aquela história era mesmo verdadeira. Contou também que aquela lâmpada onde ele vivia havia sido trazida ao Brasil por mascates a dezenas de anos atrás, e que por descuido, ela havia caído ali naquele local, e com o tempo foi soterrada, de forma que ninguém jamais a descobriu até aquele exato momento. E o gênio pediu ao agricultor que realizasse o seu primeiro pedido. E o agricultor pensou, pensou, pensou e então pediu ao gênio que plantasse ao redor da terra bilhões e bilhões de árvores, que onde houvesse um solo degradado, um pasto, uma praça abandonada e mal cuidada, uma rua cheia de cimento e asfalto, que nestes locais pudessem florescer muitas árvores. E o gênio disse ao agricultor que aquele pedido seria realizado, porém, devido à sua dimensão, ele precisaria de um dia inteiro para realizá-lo. E assim ocorreu, após o pedido, o gênio voltou para o interior da lâmpada, o agricultor então a guardou e foi embora para a sua casa. No dia seguinte, despertando, o agricultor pensou mesmo que tudo aquilo havia sido um sonho, ou uma alucinação, porém, a velha lâmpada estava ali no seu quarto, em um canto. Ele levantou-se, tomou o seu café e resolveu ligar a televisão para assistir ao jornal matutino, era um feriado, e naquele dia ele não precisaria ir ao escritório. E ele não acreditava nas notícias que ouvia, o mundo todo estava atônito, da noite para o dia bilhões de árvores haviam florescido ao redor de todo o planeta. Ninguém conseguia explicar o fato, os astrólogos achavam que aquilo havia ocorrido devido a um alinhamento entre planetas, os físicos diziam que era provavelmente um fenômeno ligado aos efeitos da gravidade terrestre, os crentes achavam que era obra de Deus, os ateus juravam de pé junto que era tudo obra do acaso, os políticos procuravam tirar algum proveito do fenômeno, alguns ecologistas também discutiam, porém, no fundo, ninguém sabia mesmo o que havia ocorrido. E então o agricultor percebeu que o gênio era mesmo verdadeiro, e ficou muito contente, afinal de contas, ele ainda poderia fazer mais dois pedidos, todo o planeta já estava reflorestado, seria o fim do aquecimento global, era enfim, a glória total. E ele saiu pelas ruas todo contente, por onde ele andava, eram árvores e árvores, uma beleza sem palavras, muitas delas já produziam sementes, e o agricultor passou muitas horas coletando um sem número delas, a fim de levá-las para sua casa e cultivá-las, e posteriormente plantá-las. E então ele percebeu que aquilo agora seria inútil, que não havia mais no mundo local para plantar uma única árvore sequer, o gênio havia feito todo o trabalho, e ele ficou tão triste com isto, o que seria agora de sua vida sem aquele trabalho que ele tanto amava, o que ele faria dali para frente, será que ficaria doravante sentado no sofá, vendo a vida passar pela tela da TV? Com o passar dos dias ele percebeu que o seu pedido havia sido um equívoco, todos os pastos da terra foram transformados em floresta, faltava leite, pois as vacas não tinham onde pastar, na África, as savanas foram transformadas em densas matas, e muitos animais herbívoros, famintos e ferozes invadiam as aldeias e cidades à procura de alimento, muitas pessoas haviam perdido seus empregos no agronegócio, faltava trigo, milho, soja, centeio, cevada, o pão encareceu, a cerveja desapareceu, os preços de uma série de produtos haviam disparado, havia fruta para todos ao alcance das mãos, os feirantes estavam em desespero, ou seja, a mudança brusca levou o planeta terra a um descompasso total. Ciente de tudo isto, o Agricultor invocou novamente o gênio e pediu para ele desfazer o pedido anterior, no que foi prontamente atendido. - Desmatar é bem mais fácil que reflorestar - disse o habitante da lâmpada. E no domingo seguinte, voltando para o campo, o agricultor estava bastante contente, podia continuar plantando suas árvores, tudo havia voltado à normalidade, refletiu consigo mesmo que a natureza não dava saltos, que tudo deveria acontecer de forma natural, sem atropelos e mágicas. Plantou algumas mudas, recolheu algumas sementes, sentou-se sob a sombra de uma árvore, e tirou da bolsa a lâmpada para realizar o seu último desejo. O gênio apareceu, fez a saudação e perguntou qual era o último pedido de seu Amo. O agricultor olhou para ele e percebeu que ele estava triste, talvez cansado de tanto realizar o desejo dos outros, e perguntou se ele, o gênio, possuía também algum desejo, ou sonhos e anseios. - Amo, desejo ser livre. Estou a séculos satisfazendo o desejo dos outros, como um escravo, e ao longo deste período todo, percebi que, mesmo realizando sonhos, nunca consegui fazer ninguém feliz. Sinto também, apesar de todos os meus poderes, muita infelicidade, pois vivo preso em uma lâmpada e não sou livre para viver a minha própria vida. O que eu mais desejo é a minha liberdade. - As palavras sinceras do gênio tocaram fundo no coração do agricultor, que então formulou o seu último pedido, na verdade o último pedido que o gênio realizaria dali para todo o sempre: - Gênio, meu último pedido é que você destrua a lâmpada e seja livre! - Lágrimas de gratidão rolaram dos olhos daquele ser, dali para todo o sempre ele poderia viver a sua própria vida em paz. E ele falou mais uma vez: - Obrigado agricultor, seguirei meu caminho, e de agora em diante, enquanto durar o seu tempo aqui na terra, para cada buraco que você cavar e plantar uma árvore, você jamais encontrará uma lâmpada mágica, porém, sentirá dentro de você uma alegria muito grande, infinita, a alegria somente sentida pelos santos, simples e puros de coração. - O agricultor e o gênio trocaram um abraço, o gênio partiu, seguiu lá para as terras da Arábia, agora profundas lágrimas brotavam nos olhos do agricultor, quantos buracos para fazer, quanta alegria para sentir, e que de agora em diante, e de uma vez por todas, pensou ele, que cada ser humano procurasse revelar dentro de si mesmo o seu próprio gênio, pois o outro, o da lâmpada mágica estava definitivamente livre, livre para sempre. Nina e Tição latiram, estava na hora de seguir adiante.
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