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A Máquina dos Sentimentos

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Era uma vez uma aldeia, em um lugar muito distante, onde, por alguma razão desconhecida, todos os habitantes haviam perdido a capacidade de sentir. Não havia entre as pessoas nenhuma emoção, tudo era feito de maneira formal e racional, de forma que, com o passar do tempo tudo foi ficando meio cinza, meio opaco... Os governantes da aldeia, preocupados com aquela situação, perceberam o problema, e descobriram que numa terra muito além, muito ao norte, os homens de lá haviam desenvolvido uma máquina com emoção artificial, e então compraram uma delas e a colocaram na praça central, onde ocorria a feira livre a séculos.   Era uma máquina com mil botões, cada botão com mil parafusos, cada parafuso com mil porcas, cada porca com mil arruelas, cada arruela com mil fios e cada fio com mil portas. Como ninguém sabia o nome correto da máquina, resolveram apelidá-la então de máquina dos mil botões. Desde então, todos aldeões, ou não, eram livres para apertarem à vontade os seus mi...

Balaio de Gatos

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Em uma das portas de meu universo mental, o feiticeiro encantado vai aos poucos descortinando seu reino mágico e maravilhoso, no qual sou convidado por ele a entrar, abandonando a realidade concreta do viver. Dentro do mundo do feiticeiro encantado, onde estou agora, tudo é exato como uma equação matemática, tudo é perfeito e programado, tudo é pontual como um relógio suíço, tudo funciona perfeitamente bem. Depois de tantos anos, estou cansado deste mundo perfeitinho e mental do feiticeiro encantado; o feiticeiro não admite nenhuma emoção ali, "quem afinal de contas precisa delas?", pensa o feiticeiro encantado. Consigo por alguns instantes ausentar-me do mundo do feiticeiro encantado, voltando novamente para a realidade concreta do viver; sinto agora vazio e angústia, dura é a realidade, e então novamente a porta se escancara, e de novo aparece o feiticeiro encantado sorrindo para mim, prometendo novos labirintos mentais para encher o meu tempo e minha vida, assegur...

A Formiga e a Cigarra

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Era uma vez, numa belíssima manhã de primavera, uma cigarra cantando em paz e alegremente em um tronco de árvore. Passava por ali uma formiga cortadeira muito atarefada, que ouvindo aquele canto, deixou sua folha no chão e foi tomar satisfações com a cantora matinal. - Dona cigarra, muito bom dia. - Bom dia formiga... - Olhe aqui, a esta hora da manhã a senhora deveria estar trabalhando, ainda não aprendeu a lição? Por gentileza, quando vier o inverno, não vá, por favor, ao meu formigueiro pedir comida e abrigo. - Formiga... - tentou ponderar a cigarra. - Não tem conversa, a senhora é um péssimo exemplo para os jovens aqui da floresta, com esta sua cantoria inútil. - Formiga... - A senhora me ouviu Dona Cigarra? - Ouvi sim formiga, ouvi sim... Agora ouça amiga: Sou uma adulta agora e aprendi muito, internet sabe, está tudo lá, uma verdadeira enciclopédia... Vivi mais de dezessete anos no subsolo como uma ninfa, já vivi todos os meus invernos e outon...

O Regresso de Marte

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Era uma vez uma casa que estava fechada há muitos anos; pelos cantos o mato grassava, tudo era sinal de abandono, as paredes cheias de limo, infiltrações por toda parte, tudo ali carecia de reparo; no quintal folhas não varridas, roseiras mortas pelos cantos, em todos os lugares somente desolação e ausência... Apareceu então um homem de meia idade que, freneticamente batia na porta; ninguém respondia, ninguém abria.  Sentou-se então nos degraus da entrada, e ficou pensativo e com o olhar distante e perdido, até que passou alguém na rua que o abordou... - Senhor, Senhor, precisa de alguma ajuda? - Gostaria muito de entrar na casa, porém a porta está fechada, e não tem ninguém lá dentro. - Senhor, moro nesta rua há muitos anos, e já faz muito tempo que não vejo mais ninguém na residência. - Meu amigo, você tem alguma notícia das pessoas que viveram aqui? - Bem meu Senhor, o dono, há muitos anos atrás foi o primeiro que desapareceu. Até onde eu sei, saiu par...

O Menino Alecrim e a Bruxa Vassorilda

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Tudo o que vai ser relatado agora aconteceu há muito tempo, bem no princípio, na época da fundação dos dois grandes Reinos da Escuridão , no tempo em que existiam meninos, bruxas, florestas e muitos encantos e desencantos... Era uma vez, no Reino Grandioso do Norte da Escuridão, o Reino do Norte, um menino chamado Alecrim, que desde muito pequeno gostava de andar livremente descalço pela floresta. O menino, fazendo jus ao nome, amava os pés de alecrim espalhados pelos campos, bem como todas as árvores que cresciam pelo chão, e possuía um verdadeiro encanto pelas andorinhas, que no verão voavam pelo céu.  Um dia, passando perto da casa da bruxa Vassorilda , Alecrim notou uma imbaúba cortada por ordens dela, o que comoveu o seu coração, e então, pegou algumas mudas remanescentes ali no chão e plantou bem longe, dentro da floresta. Voava por ali naquele dia um bem-te-vi que tudo viu e à todos anunciou: "bem-te-vi, o menino Alecrim plantou imbaúbas brancas dentro da floresta...

O Édito das Cartas Banidas

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Era uma vez, no Grande Reino dos Confins do Sul da Escuridão , o Reino do Sul, um rei, senhor de todos aqueles domínios, de nome Zão, seu filho, o Príncipe Zinho e todos os seus súditos.  Na época desta narrativa o Reino do Sul passava por alguns problemas; de uma hora para outra, não se sabe bem o porquê, grande parte dos súditos passaram a jogar baralho de forma compulsiva, negligenciando suas tarefas diárias, gerando paulatinamente dificuldades para a economia em todos os amplos domínios do Rei Zão. Preocupado com aquela situação, o rei convocou seus conselheiros reais, a fim de deliberaram sobre aquela preocupante situação.  O conselho real foi então reunido, e ao longo de toda aquela tarde discutiram a questão. - As espigas de milho estão estragando no campo, - falou o primeiro conselheiro real. - O capim cresce a olhos vistos, e a próxima colheita já está comprometida, - ponderou o segundo conselheiro real. - Os pães estão sendo entregues com atrasos c...

O Ceifador da Noite Escura

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Exausto, aquele homem havia lido em um velho livro, que a depressão era uma grande noite escura, como um imenso matagal, e que deveria então ser ceifada. Desde então, noite adentro, ia com sua poderosa e mágica foice, e sua grande vitalidade, ceifando as trevas, abrindo clareiras de luz. Depois de muito trabalho e de muita luz conquistada, o ceifador ficava contente com o seu esforço, - estava vencendo a grande inimiga, a depressão.  Cansado então, deitava e descansava, com a esperança de posteriormente voltar a combater as trevas, expandindo mais e mais seus domínios de luz com sua grande foice. Mas quando ele despertava do seu descanso, as trevas haviam novamente crescido e tomado novamente a clareira, assim como cresce o capim na primavera, e então o homem começava todo o trabalho novamente, desferindo grandes golpes na escuridão da noite, com sua potente foice, até a exaustão.