O Agricultor Urbano e o seu Velho Ego

Era um dia de primavera do mês de novembro do ano da graça de 2023, um dia quente, muito quente — segundo os cientistas um dos dias mais quentes de muitos séculos. O Agricultor andava pelo campo sentindo um imenso desânimo — provavelmente devido ao calor 
, abrindo desta maneira as portas de sua mente para a manifestação do seu velho ego, que começou a tagarelar em seus ouvidos feito o burro do desenho do Shrek...

"Desista deste campo Agricultor, é tudo inútil, o campo é público e ninguém respeita o seu trabalho. Veja bem: Você plantou e cuidou de inúmeras bananeiras, muitas delas estavam com bonitos cachos, e onde estão os cachos das bananas agora Agricultor, onde estão? Não sabe? Os espertos levaram Agricultor, e você neste momento está fazendo o papel de um grande otário." Sob aquele sol escaldante, as palavras do seu velho ego começavam a aumentar ainda mais o seu desânimo.

"Abra mão deste campo Agricultor, ou melhor, abra mão deste pasto degradado cujo chão é tão compacto feito uma rocha,  não seja tão teimoso feito um jumento empacado, veja bem, por três meses pastou por aqui um cavalo que infestou este local de carrapatos, pisoteou muitas de suas pequeninas árvores, e as que sobreviveram ao pisoteio foram friamente cortadas a golpes de facão e queimadas pelo dono do cavalo, um homem que gostava tanto de capim quanto o seu animal — seria ele uma mula? —, uma verdadeira lástima, e agora somente desolação por aqui. Todo o seu esforço empreendido no último ano foi por água a baixo, largue tudo isto, compre sua própria terra, faça uma enorme cerca e vá cuidar de sua propriedade seu obstinado, anônimo e solitário plantador de árvores, seu comportamento beira a insanidade Agricultor."

O calor era infernal; o Agricultor continuava a andar pelo campo com a cabeça baixa e cheia daqueles pensamentos negativos soprados pelo seu ego, olhava para o chão e no chão somente capim... "Está observando Agricultor, tudo agora é capim, só capim, você fracassou, desista e vá embora, ou caso não queira ir, continue aqui e coma todo este capim verdinho sua mula teimosa, muito provavelmente isto faça bem para você."

O desânimo, tal qual aquele calor anormal, aumentava a cada passo, talvez seu ego estivesse mesmo com a razão, o melhor seria de fato desistir de tudo aquilo, e então no meio do capinzal o Agricultor avistou um pequenino ipê roxo brotando do chão, e perto dele um ipê amarelo, e viu também o angico vermelho, a paineira rosa, o amendoim do campo, a aroeira pimenteira, o ingá de metro, a sibipiruna e inúmeras outras árvores crescendo em meio ao capim em busca da luz, e de cada uma daquelas pequeninas árvores ele ouvia radiante de esperança "não desista de nós Agricultor, nós estamos aqui, continue com o seu trabalho, nós contamos com você, nós confiamos em você", e aquela visão novamente despertou o seu natural estado de consciência.

— Velho ego, por favor, pegue a minha enxada e acompanhe-me! Vou precisar de sua ajuda para retomar a recuperação deste campo degradado e desolado — exclamou o Agricultor Urbano com voz imperativa.

Antes mesmo que o Agricultor terminasse de falar, ouviu ainda do seu velho ego "vá para o diabo", enquanto corria feito um louco em busca das árvores próximas, em busca de sombra e água fresca; estava rubro de raiva por te sido contrariado, fazia birra batendo os pés no chão falando continuamente feito um papagaio "Uma enxada, que insulto! Ah, este Agricultor Urbano me paga, ele me paga!"

Comentários

  1. Gratidão Aluísio. É isso uma luta entre dois sistemas para lidar com o Senhor Ego.Tome trabalhar até educa -lo.

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