Cadê os Passarinhos?

Como sempre faço todos os dias, peguei o ônibus no ponto, como sempre correndo; o motorista dirigia feito um louco, freando bruscamente, reclamando, buzinando, acelerando... Todos ao meu redor com pressa de chegar, todos fechados em si mesmos, por todos os lados internet, inflação, corrupção, eleição, futebol, jornais, revistas, propagandas, carros, vendedores ambulantes...

Cheguei no meu ponto no Largo da Carioca, desci e atravessei a rua correndo, pois o motorista na sua pressa poderia mesmo passar por cima de mim, que loucura meu Deus — seriam os motoristas cariocas meus inimigos figadais?

Na Rua 7 de Setembro com a Avenida Rio Branco queria pegar o sinal verde, mas não foi possível, o danado fechou, que droga, vou perder três minutos da minha apressada vida! Parei, observei as pessoas do meu lado, todas olhando para lugar nenhum, todas querendo ir a algum lugar, meu Deus o que faço agora parado nesta esquina junto com todos os outros?

Olhei para cima, olhei para o céu, e que maravilha, o céu estava lá, o sol estava lá... o céu de um azul lindo, um azul de abril ainda em janeiro, estava esquecendo-me de quão lindo é o azul do céu de abril. Olhei também para as árvores, que maravilha, existem árvores aqui! São verdes, são bonitas, são majestosas, são grandes...

Procurei pelos passarinhos nas árvores, porque me acostumei a ver passarinhos nas árvores, porém, os passarinhos não estavam lá. Nem na primeira árvore, nem na segunda, nem na terceira, nem em árvore nenhuma, que coisa meu Deus! Cadê os passarinhos? Como podemos viver em um lugar sem eles? Por que eles se foram, alguém sabe? Talvez tenham partido por não gostarem de barulho, jornais, revistas, televisão, internet; talvez tenham ido porque em nosso louco cotidiano não temos mais ouvidos para ouvi-los — estamos viciados em ruídos —, não temos mais tempo para contemplá-los. Cadê o pardal, cadê o tico-tico, cadê o canário, cadê o tié, cadê a andorinha, cadê o sanhaço, cadê a sabiá?

Será que é por isto que andamos todos preocupados e mal humorados, afinal, a vida sem passarinhos ao redor não é nada fácil. Ah... o danado do sinal abriu encerrando bruscamente os meus três minutos de contemplação, fui então com os demais atravessando a faixa e apressando-me para entrar em minha gaiolinha na Rio Branco 110, décimo quinto andar, uma dourada e grandiosa gaiola de um banco multinacional. Antes de entrar na minha gaiola urbana ainda dei uma última e esperançosa olhadinha esperando achar um passarinho, mas, infelizmente tudo em vão.

Passarinhos, por favor voltem, cantem para nós, abafem o som maluco de nossas cidades, tragam alegria para o nosso viver, estamos precisando tanto... Fecharemos os jornais, as revistas, a intranet, a mídia... fecharemos nossas mentes e abriremos finalmente nossos coração tão somente para ouvi-los; quem sabe com a volta de vocês a paz retorne às nossas vidas, quem sabe reapareça a amizade sincera, o sorriso franco, o abraço caloroso, a alegria de ser e existir. Voltem meus amigos alados, voltem por favor e nos ensinem a voar, nos ensinem a viver com leveza, tranquilidade e suavidade.

Nove horas em ponto, chegou a minha hora de entrar na gaiola e sentar no meu poleiro, mas, quem sabe amanhã eu encontre um tico-tico solto por aí pousado em alguma árvore da Rua da Carioca ou adjacências, quem sabe?

Rio de Janeiro, 08 de Janeiro de 2001.

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