O Pé de Mexirica

Pé de Mexerica
Domingo ensolarado, outono, céu azul, uma beleza de dia. E o agricultor foi à casa de seu velho pai, entrou quintal adentro, e descobriu um pé de mexerica carregadinho, muitos frutos amarelinhos, uma beleza. Ali mesmo, sem muita cerimônia, deliciou-se com os frutos tão gostosos. A planta deveria ter uns 10 anos de idade, pensou ele, e foi plantada pelo seu pai, e estava agora frutificando pela primeira vez. Encontrou muitos frutos bicados por pássaros, eles também já haviam descoberto a iguaria, que maravilha, seu pai ficaria contente em saber. E no seu pensamento ele corre a chamar o pai e a falar com ele sobre o evento, e o pai sorridente, feliz, vai ao encontro da planta, sorri de contentamento pela beleza e fartura, agradece a Deus, e afirma por tudo o que é mais sagrado que nenhum homem conseguiria realizar um feito como aquele, nem mesmo os americanos que foram à lua, e pai e filho sob a sombra da mexeriqueira conversam enquanto vão chupando aquelas frutas doces e ácidas, que beleza de encontro. Porém o agricultor contempla a planta solitariamente, no fundo com um pouco de tristeza,  seu pai está lá na casa, sentado no sofá, e apesar disto, não pode mais ir ao quintal e colher da fruta que ele semeou, não pode mais assistir aos jogos do seu Flamengo querido, não pode mais pegar a vassoura e limpar o quintal, ou levar o lixo para os garis coletarem, não pode mais ir à esquina fazer uma "fezinha" no jogo do bicho... O agricultor diz "Sua benção meu Pai", e o pai não mais responde, seu olhar está agora perdido, indefinido... É muito triste contemplar um jardim sem a presença de seu jardineiro, as flores estão lá, as frutas estão lá, o limoeiro está lá, carregadinho, as bananeiras estão lá, repletas de cachos, o hibisco rosa está lá, tudo está lá, exceto o jardineiro, o jardineiro cujas mãos cultivou tudo isto está no quarto, agora não mais a tesoura, não mais o enxadão, a enxada, agora não mais suas ferramentas, o velho agricultor está cansado, muito cansado, o mal de Alzheimer é agora seu companheiro, talvez no final este mal possa mesmo vencê-lo, mas jamais mal algum conseguirá derrotá-lo, seu lindo pé de mexerica está lá no quintal, jovem, belo, forte, e os frutos deles serão semeados e outras mexeriqueiras virão, e os sonhos que ele sonhou também serão sonhados e realizados por outros, os homens passam, porém suas obras e exemplos permanecem, e tal como a mexeriqueira, hão de frutificar no coração de muitos outros que virão.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Agricultor e a Poetisa Ferida

O Marido, a Mulher, o Rio e a Calça

A Finitude das Redes e a Infinitude do Mar