O Amor Nos Tempos dos Pregos
É manhã agora; lá está o velho caminhoneiro com sua mente exaurida pelas longas viagens da vida, homem que andou pelos campos da Europa combatendo — quem sabe? — os alemães, seus irmãos em humanidade. Acompanhado agora está pelo outro alemão — o Alzheimer — com seu corpo ainda ativo, desamassando pregos...
Desamassa com capricho um por um, e com todo o carinho vai colocando cada um deles em uma lata próxima, examinando todos metodicamente, uma tarefa que beira a perfeição; o alemão não o incomoda. Apesar de todas as limitações impostas pela mente em desalinho, consegue ainda fazer o que fez com amor por toda a sua vida, consegue ainda trabalhar.
É tarde agora; lá está o cuidador do caminhoneiro, seu filho, mente ativa e criativa, mente de cientista e coração de anjo, doando com todo amor o seu tempo, amassando ao longo da tarde todos os pregos que o pai desamassou por toda a manhã. Ele carinhosamente pega na lata cada prego que passou pelas mãos de seu amado pai, e vai caprichosamente amassando cada um deles com toda a paciência do mundo, e enquanto vai amassando vai pensando... Amanhã estes pregos amassados ocuparão a manhã de meu pai, e ele vai sentir-se útil e feliz... A felicidade do pai no dia de amanhã já é a sua felicidade agora.
É mesmo paradoxal o amor; algo muito suave, muito simples e sutil, fruto de almas delicadas e sensíveis, e pode mesmo estar contido no ato de desamassar pregos por toda uma manhã; como pode também estar presente na ação de amassar estes mesmos pregos por toda uma tarde, porque o amor não é manhã, porque o amor não é tarde, porque o amor é eterno, é eterno agora.
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