O Manacá da Tia Lourdes

Manacá da Serra, árvore nativa da Mata Atlântica
O agricultor andava feliz da vida entre árvores que ele havia, ao longo dos anos plantado nos fundos do seu quintal. Havia lá uma grande variedade delas, muitas já com vários metros de altura, atraindo pássaros, produzindo sombra, beleza, frescor, abundância... Lá estava a paineira rosa, o ingá, a sibipiruna, o pau ferro, o pau jacaré, a embaúba, e tantas e tantas outras, árvores de sua infância, árvores da mata atlântica, tão amada por ele, árvores da sua vida. Aos poucos, por puro gesto de amor e gratidão, ele ia montando o quebra cabeças daquilo que havia sido no passado uma exuberante floresta, com uma infinidade de variedade de plantas, tudo destruído ao longo de décadas de exploração pelas necessidades, ou não, bicho homem, as árvores foram, uma a uma caindo para o café, para o gado, para a indústria, para o fogo, para as casas, para a ganância, gradativamente a beleza da mata foi dando lugar a aridez do pasto. Quando o agricultor conseguia uma muda ou semente que ainda não havia na sua plantação, sua alegria era imensa, era como se fosse aquela figurinha difícil de ser encontrada, aquela que preenchia o álbum, foi assim com as palmeiras juçara e brejauva, o jatobá, o jequitibá branco... Muitas e muitas mudas, ou figurinhas, já estavam lá no seu álbum natural, uma beleza, porém, quando ele andava pela mata, sentia a falta de uma árvore de rara beleza, o manacá, este esta estava em falta na sua coleção, já havia procurado e ainda não havia encontrado, mas ele era um otimista, e sabia que de alguma forma, mais cedo ou mais tarde a muda apareceria. E um dia, na casa de seu pai, encontrando com o irmão, recebe a notícia que havia uma muda de uma árvores enviada pela sua tia, a Lourdes, irmã de seu pai, o caminhoneiro solitário, como presente. Que árvore seria aquela? pensou o agricultor. E então ele passa na casa do irmão e lá estava ela, dentro de um saquinho, a muda do manacá, a figurinha perdida do álbum, uma maravilha de árvore, de florada exuberante, um presente da tia Lourdes e da prima Raquel, um presente de Deus. Alguns dias depois, lá nos fundos do quintal, próximo a um cajueiro e um ipê amarelo, o agricultor cava uma cova profunda, colocando nela muita matéria orgânica, muito amor, e ali planta a árvore tão desejada, fazendo votos a fim de que ela possa crescer e florir, cumprindo sua missão. No seu coração um sentimento de alegria e gratidão pela planta, pela vida, pela tia, pela prima, por Deus... "Quem sabe, pensou o agricultor, eu viva muitos anos, quem sabe, eu possa vê-la crescer e florir, e sempre que passar ao seu lado a lembrança do gesto do amor da tia e prima visitará o meu coração, e isto será bom, e lembrando-me da tia, lembrarei-me também dos avós, dos primos, das outras tias e de tantos e tantos outros da família do meu pai, que com gestos simples e anônimos fazem verdadeiramente a terra girar. O amor que emana e emanará desta árvore terá sempre o poder de preencher a minha vida de alegria e paz, será como uma bússola apontando sempre para a direção em que preciso seguir, para o meu norte, para a casa de meu Pai Celeste". 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Agricultor e a Poetisa Ferida

O Marido, a Mulher, o Rio e a Calça

A Finitude das Redes e a Infinitude do Mar